Um Bom dia com Garcia
Pois é, já percebi como é que dou conta desta merda. Como é que dou conta de todos os meus deveres. É, paradoxalmente, trabalhando, trabalhando que nem um porco e sempre antecipadamente. É exactamente isto. Para que os tempos livres sejam efectivamente livres e meus. Só meus. Assim vislumbro todo o calendário e não me assustam as suas tarefas. Assim domino-o! É feio que assim tenha que ser. Mas para já sou aluno, não sou professor falando bem e rápido. Tenho que jogar no meu tabuleiro e com as peças que tenho. E sim, tenho que ser soldado. Eu neste momento sou um soldado, afinal de contas. Um cabo de merda é o que é. Mas sou também o general, há que ver. No entanto, é ainda inevitavelmente a pátria que sirvo na maior parte do tempo e não a minha pessoa. De qualquer maneira estou cá de passagem e a carreira não me interessa, contudo, é a pátria que detém a minha terra e os meus e, é aí que reside o problema. É por isso que aqui estou. Aqui para se ser o monge como o Agostinho da Silva diria tem que se ser o soldado. Apesar do meu objectivo passar por ser um e outro simultaneamente para ser algo ainda mais evoluído: Para ser o índio! Havei dito! Voltando um bocadinho atrás, é fabuloso como recupero a liberdade se mantenho esta disciplina. O tempo continua a escassear mas enquanto dura eu sou. E até parece que ando aí aos pulos em pézinhos de lã. Esta foi um bocadinho abichanada. E que seja! Adoro isto: ser tudo e não ser nada. E não me poderem acusar de nada porque eu não sou nada efectivamente, e, ao mesmo tempo, sou tudo. Pois, felizmente, não sou uma daquelas muitas vítimas que são apenas a reacção à acção que sofrem. E assim assumem um único papel, normalmente, na menos má das hipóteses, o papel contestário, claro. E que por ser contestatário as consola, as protege e satisfaz. Mas a questão é outra, é ser um Marlon Brando que marchava tudo o que lhe aparecia à frente, que foi estrela de Hollywood multifacetada ao mesmo tempo que lutava pelos direitos dos negros na América e dos índios Dos índios, meus amigos... É, o difícil mesmo é não entrar nessa cadeia infindável da acção reacção, não nos identificarmos com o agressor em linguagem psicanalítica, o difícil mesmo é a não resistência de que fala o Aikido: temerária mas que possibilita manter clara a visão e viva a integridade. Por exemplo, a minha mãe gosta muito do Bruce Willis, lá está um guerreiro, ou melhor, um peão, um objecto sexual. Mas ela gosta... E no entanto a coragem, a verdadeira coragem reside na paz. É difícil gajo mais corajoso que o John Lennon. Lá está. É que há muito mais coragem na paz que na guerra. Metade da população conseguiria ser um Bruce Willis. Porra, é fácil! Agora um John Lennon... Fica o desafio. É que a questão é que na paz quem está lá somos nós, e somos nós quem vai à luta. Isto porque na paz anda-se nú e de braços abertos. Na guerra não somos nós que vamos à luta.
Não somos nós é o soldado, o soldado que nós não somos.