29/11/2007

Recordações:
Sono leve, cheiro a banho.
Passos contidos, abotoamentos e fechos, velcro...Apanhar as coisas, preparar para mais um dia.
O cheiro...ainda o sinto.
Um beijo de despedida.
Até logo

27/11/2007

Ritmos

Acorda um dia e pensa no que tens que fazer.
Olha para o relógio e apoia-te num calendário.
Rege o teu dia por algo concreto e inequivocável, e segue.
Vai, fala...
Liga-lhes e insiste para que te oiçam, que te percebam.
Ou tenta dar explicações...
Pede que se que recordem,
que simplesmente registem os sons que lhes transmites.
Doces frutos ,que um dia nos pode dar.
Momentos que um dia nos vai mostrar...
Acompanha-te com cuidado, segue o teu crescimento.Pois vives.
Estás ao teu lado.
Tão perto de ti.
Inspira, expira, inspira,expira....

ou simplesmente respira.

ufff.saiu

26/11/2007

Procuro-me

Pego na pá e começo.
Começo a escavar.
Não sei se lá chegarei mas a vontade é cega.
A pá é pesada e isso agrada-me.
Escavo, escavo e escavo.
E vejo-me na sala de aula do 6º ano. Elege-se o delegado de turma e eu sedento por ser o escolhido.
Não é isto que eu quero.
Continuo a escavar.
Continuo.
E mais uma vez eu apareço. Estou a receber o diploma do mais colono na ACAJ. E é o Kiko quem me o entrega. Há muito barulho. Muita pressão. Sinto-me mal...
Pego novamente na pá.
Olha, agora estou no liceu, sentado. Diz-me a Élvia, que tenho muitas raparigas que gostam de mim. E eu apenas sorrio. Não denuncio qualquer escolha. Tento apenas preservar-me.
Cuspo para o lado e escavo mais ainda.
Mais, tem que ser mais!
Vejo-me no quarto a estudar para passar nos exames do 2º 12º ano. Estou pálido e já lá vão três horas seguidas.
Continuo, já suo e arfo agressivamente.
Acelero o ritmo ansioso e oiço a voz do meu pai.
Conta mais uma das suas façanhas.
Não quero ouvir.
Escavo para o lado fugindo mas ainda o oiço a ordenar-me a execução de uma qualquer tarefa caseira.
Mando-o à merda!
E escavo, escavo, escavo, escavo.
Dei um encontrão em alguém.
-Desculpa lá
sai-me automaticamente.
Está de costas, essa pessoa, na cozinha da minha casa.
Aos poucos, apercebo-me que é a minha mãe.
-Desculpa mãe
não me responde...
A tristeza é de uma natureza que coíbe a agressividade.
Contenho-me na sua presença.
Mas continuo.
E agora continuo já com ódio.
Descoordenam-se os movimentos bruscos
e com a pá faço um golpe na cabeça.
O sangue escorre e isso agrada-me.
Lambo o sangue.
Continuo...
Agora encontro-me com os meus amigos. Estou eu a falar. Mas falo dos problemas deles. Ou quando falo dos meus é como vítima.
Que solidão!
Não é isto que eu quero ver, caralho!
Pego mais uma vez na pá, não consigo descansar.
Olha agora os meus irmãos.
Deixam passar-lhes ao lado, a minha alegria. E riem-se não sei bem de quê.
Caguei para eles.
Continuo, continuo e continuo.
Escavo, escavo e escavo!
Até que finalmente consigo chorar.
Finalmente!
Choro abundante e livremente.
Lágrimas gordas que refrescam a cara e acordam os sentidos.
Encosto-me à parede do túnel, sentado, e abraço os joelhos.
Que alívio, que sentimento libertador.
Demoro-me no prazer. E tento com ele aprender...
Está escuro, não vejo nada, mas sinto-me bem até.
Estou sozinho...
Decido levantar-me. E espontâneamente escolho um caminho diferente do que parecia que estava planeado.
Sigo esse caminho.
Não sinto o cansaço.
Corre-me uma adrenalina desenfreada pelo corpo.
Quase que lhe sinto o gosto.
Parece-me deliciosa.
Continuo e.....
Começo a ver pequenos raios de luz a espreitar pela terra.
Tenho medo, paro de escavar.
Olho por entre um dos buracos e vejo-me, novamente.
Sorrio. Mas o meu sorriso é diferente. É meu. Pareço feliz.
Desvio o olhar do buraco.
Tenho medo.
Os outros estão muito longe daqui.
Estou completamente sozinho.
Foda-se! Tenho medo.
Olho novamente pelo buraco e,
Trim, trim, trim!!!!
Toca o despertador.

21/11/2007

Ontem à noite lembrei-me de mim, lembrei-me de nós, lembrei-me de vocês.

Belos momentos que vão acontecendo aqui por baixo.
E é em momentos como esse.
Em que ousamos reinvindicar, em bruto, a nossa dignidade
e dizemos: Pára! Pára tudo!
E tudo pára.
Que se ouve o silêncio...
Então, fazemos música com a nossa presença.
E o presente acontece.
E o presente não esquece o passado
e não deixa de sonhar o futuro.
O presente é o acto de ser.
E nós somos aqui.

Tempo que voa por nós

Roubam-nos o espaço e o tempo, meu amor!
Não deixes fugir a desorientada disponibilidade
E tolera os meus modos, por favor.

19/11/2007

A fúria de tempos passados assombra novamente este dia aguado.
Cinzento e sombrio anuncia uma tempestade interior que parece incontrolável.
Apodera-se de mim e em desespero procuro maneiras de o deixar sair.
Libertar este peso que retenho.
Após impulsivas tentativas de confronto directo, a escrita apresenta-se terapêutica e conduz-me no discurso.
Carta triste, será pesada para quem a recebe.
A complexidade não é pesada e nunca me abandonará, é minha.
A ti uma carta triste e simplicidade eterna.

12/11/2007

Para "Quis viver"

Há momentos em que quase nos esquecemos do corpo ainda que, compreensivelmente, sejam raros ora não fosse a compaixão ( e a não compaixão ) constantemente física e brutalmente corporal de todos os dias...usas a linguagem da humanidade.

11/11/2007

Quis viver

Abro a porta da cozinha que dá para o jardim.
A noite é já madura,
e tudo está estranhamente calmo e sereno.
Tudo parece oferecer-se.
Sento-me na cadeira e acendo um cigarro.
Trago em mim, ainda quente, um livro que me encantou.
Um livro dum índio.
Um livro com a visão de um índio.
Trago, em mim, também, ainda muito prazer.
É uma noite de princípios de Setembro e as férias correram bem.
Sinto-me bem em mim.
Levanto lentamente a cabeça.
Olho em redor e é como que se a cumplicidade me atordoasse.
Como quando vejo uma mulher,
uma mulher bela de mais...
E falo da minha beleza, não de uma outra qualquer.
Olho em redor e tudo me toca, tudo me fala.
Tudo me chama...

Sinto, então, nesse momento, que posso morrer.
Não sei porquê mas senti que não haveria qualquer problema.
Não.
Mais. Mais que isso.
Senti que, de facto, queria morrer!
E queria.
Queria responder ao que me chamava.
Queria-me entregar. Mas entregar-me de olhos fechados.
Então como que comecei a ensaiar,
a ensaiar percorrer os negros caminhos de tal desejo.
Mas a caminhada revelou-se de outra natureza.
Eram ténues as diferenças
e o paradoxo evidente.
Estava completemente enganado.
Não havia nada de mórbido.
O que havia era aquietamento.
E um aquietamento extremamente sedutor, leve e elegante.
E um desejo, um desejo forte e profundíssimo
de eu finalmente me deixar levar
e me entregar
a mim e ao vento que iam a passar.

A pedra e o cão

E a pedra que está por baixo de mim está fria porque já encontrou o seu lugar.
Eu não.
Eu tento ser um cão.
O cão rafeiro de que me fala o Agostinho da Silva.
Rústico, corajoso e persistente.
Este, sim, é um bom temperamento a ter para com a vida.
Porque ao contrário da pedra que já contempla,
a criatura de sangue quente,
detentora de calor, só descansa em movimento.
Só descansa aquecendo.
Só descansa se oferecendo.

há dias assim

Hoje o sol não apareceu no horizonte.A minha percepção não conseguiu ver a linha onde termina o céu...
Sombrio e pesado começou em sobressalto...Não há nada pior do que aquele momento imediato depois de acordar em que te lembras...Ganhas consciência novamente, revives em segundos tudo.Porquê a tormenta matinal?
Confuso, derretes pelas escadas com a inquietação crescente a palpitar.Tudo deixa de fazer sentido, a perturbação apodera-se manipulando até desistires de fazer seja o que for.
E faltam ainda 14 horas para me entregar ao son(h)o...
Que violência.
Um dia tens que parar antes que me destruas.

10/11/2007

biter sweet

Num canto escuro qualquer ficou a crescer...a preparar-se;definindo uma estratégia , observando os pontos fracos e sempre a crescer...a crescer.
Surgiu um momento oportuno e ela saiu preparada, partindo do seu canto para depois tomar conta do resto da carcaça...Nunca tive hipótese.
A sua chegada era esperada embora a sua permanência não o fosse.
-Sacode-te enquanto é tempo!( ouviu-se lá atrás)
-Não há tempo.Há consciência e crua existência.


Solitária e amarga viagem que só
pode ser levada até ao fim.
Quanto tempo faltará?
Como lidar com a demência e a confusão instalada quando estamos parados , entorpecidos por dentro?Não entendo os sinais,nem o rumo das coisas...Para onde vou?

O tempo sábio toma um caminho paradoxal.
Tudo está a piorar...a crescer, a crescer sempre a crescer.
Quanto tempo mais desta demência?