30/05/2006


-É que para falar dos Outros não falo em Nós, e os outros não me interessam. Quem são eles que, por tão longe que estão, sinto tão distantes, não os conheço, nem sei quem são...
Assim tomo-os por máquinas pois só os vejo a actuar, observo a sua organização e estrutura, gestos e comportamentos, pouco mais, a nós sim, consigo realmente ver-nos e saber quem somos, basta-me saber que sentes para saber que És. Os outros hão de ser sempre Outros...

Calçada amarela

Hoje acordei bem-disposto. Levantei-me da cama facilmente e, de t-shirt amarrotada e boxers aos quadradinhos, calcei uns ténis e saí à rua automaticamente. O céu estava aberto e bem azul, com uma compacta e atraente nuvem branca aqui e ali, e o tempo estava bastante agradável, entre o ameno e o quentinho. Com o sol a bater-me na face fui andando estrada abaixo em direcção à estação, tirando uma ou outra remela do canto dos olhos, a cantarolar a música do Rocky – “rising upppp!back on the streetsss…took my chances..” – acompanhando com uma coreografia improvisada na altura. Neste meu trilho ouvi alguns berros e buzinadelas aleatórias, achei uma atitude um bocado estranha… – Quem é que vai fazer poluição sonora num dia tão bonito como este?

Chegado à estação sentei-me conscientemente no banco onde o sol batia com maior precisão pois apetecia-me sentir o carinho aconchegante do calor solar no meu corpo. Fechei os olhos e usufrui ao máximo cada brisa fresquinha que se passeou pela minha bochecha. Recomecei a cantar entusiasmado, ainda de olhos fechados e com uma apurada projecção vocal, mas desta vez o som que espontaneamente me saiu da boca era proveniente da minha língua materna…”na terra dos sonhos podes ser quem tu és, ninguém te leva a maaal. Na terra dos sonhos toda a gente trata a gente toda por igual…”. Ia eu cantando animadamente liberto quando começo a ouvir no meu espaço auditivo um som mecânico e evolutivo, tão sinistro como atraente, a aproximar-se gradualmente – era o comboio com certeza. Levanto-me prontamente, abro os olhos devagarinho e entro na porta mais próxima de mim quando este pára.

Ao entrar na minha carruagem encontrei logo um espaço num banco para duas pessoas onde somente se sentava à janela uma simpática senhora, já de idade avançada, com um cabelo cinzento encaracolado bem tratado e uma pele clara e bem luzidia. Ao sentar-me a seu lado reparo que a senhora se levanta instintivamente, oferecendo-me o banco gentilmente. Agradeço com um sorriso enquanto a observo a mudar de carruagem e encho-me de alegria quando percebo que vou poder ir à janela como tanto gosto! Posso agora apreciar a fabulosa paisagem natural que vai ficando para trás à passagem do veloz comboio, o sol e o mar, as aves e as pessoas, é uma sensação de beleza em movimento que me cativa muito. Motivado pelo magnífico fenómeno a que assistia voltei a soltar a minha voz desmedidamente…”I´m on the highway to hell, highway to heeell!”, ia eu gritando bem alto com um divertido sorriso estampado na voz.

Quando me encontrava prestes a chegar à última paragem, o Cais do Sodré, apercebi-me de que não tinha comunicado com ninguém durante a viagem, exceptuando o sorriso de agradecimento que lancei à idosa senhora que me concedeu o seu espaço. Á saída da minha carruagem reparei que a estação estava com bastante gente e muitas delas olhavam directamente para mim, umas de olhos bem abertos, outras a sorrir compulsivamente, outras a sorrir compulsivamente de olhos bem abertos. Fui retribuindo os sorrisos e acenando vivamente às pessoas que me fitavam enquanto passava por elas em direcção à saída da estação com um andar gingão. Achei piada a esta recepção e decidi dirigir-me à tasca mais próxima para beber uma imperial bem geladinha e para conversar com alguém.

Foi então neste perdido caminho que fui brindado por uma imagem maravilhosa, surreal de tão real que era, que arrepiou positiva e incrivelmente cada pêlo do meu corpo - a minha alma palpitou. Uma rapariga, com os seus 20 anos, saltitava alegremente ao andar enquanto ia brincando a conversar com as suas amigas de uma maneira bem castiça. Eram um grupo de seis belas e vistosas pré-mulheres, bem vestidas e possantes, que iam espalhando charme com seus cabelos brilhantes e suas roupas curtas e chamativas; mas ela demarcava-se claramente das amigas. Não era alta e poderosa como elas, não andava na rua como se estivesse numa passagem de modelos como elas nem utilizava aquelas roupas excessivamente luminosas e extravagantes. Nada disso. Gravei o meu olhar no seu curioso movimento corporal, meio acriançado e desajeitado, mas invulgarmente sensual. Delirei com a doçura do seu olhar e a magia do seu sorriso, tão bem encaixados naquela querida epifania de 1,60m. O seu cabelo castanho-de-avelã, ondulado até ao nível do seu sensível queixo, ia balançando expressivamente enquanto espalhava energia por tudo o que a rodeava – era uma imagem gloriosa a que o mundo me apresentava naquele lindo momento! Comecei a deslizar levemente na sua direcção, como que num estado de transe, com todo o meu ser extasiado nela, nada mais existia no meu Estar e Ser, naquela altura todos os meus sentidos estavam com ela, Todos. Só a via a ela, só a ouvia a ela, só a sentia a ela…e sentia-a tanto!...

Ao aproximar-me cada vez mais acabei por entrar naturalmente no seu campo de visão. Ela parou de andar de uma forma natural e ficou a fitar-me olhos nos olhos, tinha uma singular expressão que aliava o expectante ao afável. Que olhar que ela tinha..! Os seus olhos resplandeciam prodigiosamente como o reflexo que um fascinante nascer do sol origina no ondulante oceano. Eram grandes e escuros, pretos mesmo!, tão escuros que se uniam à sua íris numa extraordinária junção que lhes conferiam uma profundeza tão infinita que seria preciso uma vida inteira para descrevê-la em palavras.

Ao chegar a ela já o meu corpo transbordava energia, ouvia todo o meu organismo a cantar, todo o meu ser delirava desmesuradamente, arrisco afirmar que naquele momento eu podia voar se quisesse…mas não era isso que eu queria.

- Olá… - disse-me docilmente, esperando a minha reacção com um sorriso maroto e afectuoso.

Alarguei meu sorriso até ao horizonte e, sem nunca descolar o nosso olhar, estendi minha mão direita harmoniosamente e senti a sua sedosa bochecha através de um simples e mágico toque com o polegar. Ela abriu os olhos surpreendida e eu vi-os a cintilar..

- Vamos? – perguntei-lhe tranquilamente.

- …Onde?

- Não sei. Vamos simplesmente…?

- Porque estás assim vestido? Ou semi-vestido no caso… - interrogou-me divertida.

- Porque sim – respondi feliz.

- Vamos então – disse-me ela com um sorriso puro e contagiante, aconchegado entre as suas sedosas bochechas…

Fomos.

29/05/2006

Tantas vezes tempo

Estou inevitávelmente integrado numa rotina social que inconscientemente me afasta do que é realmente ser Humano, procuro então libertar-me desta realidade não contando o Tempo. Basicamente pretendo não classificá-lo, isto é, tomarei todos os segundos do meu dia como aproveitados visto que são vividos. A expressão “foi tempo perdido” deixará de fazer sentido nesta minha postura. Com esta atitude pretendo, acima de valorizar o meu ego, credibilizar todos os meus actos como reais formantes de um percurso, assim valorizo todo o meu espaço e não o meu tempo. Porque é em espaço que eu comunico e produzo, e não em minutos, é na dimensão do ser e do sentir que me coloco e não na do tempo.
O tempo desmistifica qualquer situação quando o seu valor é incalculável. É redutor e amedronta quem pense em percurso ou em projecto, o tempo torna qualquer espaço irreal, quando material.
Independencia é o que procuro, continuo a tentar definir liberdade, fomentado pela criação continuo com os meus objectivos definidos, definidos em mim, assim deixo de ter prazos. Cada vez mais dou valor ao etéreo e ao impalpável, porque na sua dimensão não existem obstáculos. Qual o tempo de um sonho? Quanto dura o intocável?
Caminho agora ao ritmo do meu corpo e mente, sintonizo-me em mim e finalmente estou ao meu alcance, tenho momentos inigualáveis que substituem os segundos por vida, apago as ideias de passado e de futuro, e também a de presente, e simplesmente Sou.

Matéria

Inspiro e incido em mais um problema da minha realidade, constato que não me dou bem com o mundo e com a matéria artificial, a criada pelo Homem, reparo que esta me oprime e não me deixa fluir como preciso, reaparo que actuo à sua mercê,e que me sinto reprimido, como que programado para não falhar, agora, que tomo este problema como real, fustiga-me o não conseguir Estar. Poderei catalogar este como um problema absurdo, até surreal mas coloco-me e assumo-me nesta dimensão. Na dimensão do impalpável, pois estou de mãos atadas.
Procuro abstrair-me da relação comum da minha civilização com os materiais, sinto-me mais importante do que eles e assim desbloqueio os meus sensores que lhes atribuem valor real e material. Posiciono agora a matéria numa posição inferior à minha, à do Homem, e não aceito o seu domínio. Agora sou muito mais valioso do que qualquer copo, porcelana, vidro ou metal e assim muito mais forte do que qualquer um deles. Posso então decidir o seu futuro e viver num patamar superior ao deles, pois eu domino-os. Agora posso agir segundo os meus sentidos e impulsos respirar ar de liberdade e repulsar o que me bloqueia. Bloqueiam-me todos os obstáculos qualificados como valiosos, caros, baratos, frágeis, delicados, finos, clássicos e modernos, classifico-os então com o mesmo grau de importância, chamar-lhes-ei matéria e apenas matéria.
Pois então decido agora que partirei um copo quando e se me apetecer, e aí sentirei que estou vivo pois sou livre. Não tomarei nunca um gesto de violência como insignificante, considerarei o vandalismo e a delinquência, não atribuirei valor às suas consequências mas à intenção em si impostas. Impeço o meu inconsciente de automáticamente catalogar negativamente estes comportamentos sem antes pensar nos resultantes e integrantes frutos de qualquer acção. Considero a hipótese de tomar como pacificos e positivos os verbos partir, quebrar, rebentar, destruir, estoirar, esmigalhar, desfazer e amassar, elogiarei se merecido todos os praticantes de violência para com os materiais, pois decididamente temos que distinguir-nos como reais.

27/05/2006

verdades recuperadas ao subconsciente pelo meu consciente

Em qualquer sitio onde esteja, mesmo nos locais mais longínquos e invulgares, continuo a ter sempre presente no meu subconsciente a ingénua esperança de que podes aparecer a qualquer momento... Imagino-te a surgir no meu espaço visual a saltitar naquela tua curiosa forma de andar, com teus olhos repletos de vida e um sorriso maroto a espalhar magia, a perguntar-me com naturalidade.. - então andré! Tá tudo bem?..Que fazes por aqui?
- Estava só à tua espera, responderia eu




parque dos poetas, 27/5/2006

22/05/2006

Erros (pre)vistos

Quando me propuseram escrever estas linhas o primeiro impulso que tive, mesmo antes de a ideia me agradar, foi o de pensar que teria de fazer algo para alguém e que, consequentemente, esse alguém esperaria então algo de mim. Ao ouvir da boca do meu amigo as cruas palavras “preciso que me escrev…” o meu corpo tornou-se instantaneamente tenso, quase em pânico; o estômago entrou numa convulsão estupidamente desorientada, senti o coração a bater com potência nas paredes do meu crânio e um súbito arrepio incrivelmente macabro percorreu-me rigorosamente desde a planta dos meus pés até ao cucuruto numa gradual propagação de sensações negativas transmitidas inconscientemente através do meu impiedoso hipotálamo para cada pedacinho do meu ser.

Apesar de não o aparentar exteriormente, no meu interior o estado de tranquila despreocupação que respirava na altura transformou-se num misto de ansiedade e alerta neurótico, de conclusões fatalistas precipitadas e de atenção receosa ao que me rodeava. Esta instintiva reacção, que durou um par de intensos segundos, serviu apenas de entrada à defensiva cisão que logo se criou no meu difuso estar pensante – de um lado encontrava-me eu a discutir comigo mesmo, duvidando da minha capacidade para agir e perspectivando cenários de falhanço e desilusão; do outro estava eu a encaixar a ideia que o meu amigo me queria transmitir, fazendo um esforço por me concentrar e interessando-me verdadeiramente pela cativante proposta que me apresentava.

Neste debate interior o meu consciente ia sendo encostado a um beco por dois pólos divergentes – o meu medo de agir (causado pela monstruosidade do erro), que ia questionando a minha real habilidade para escrever e a minha fraca capacidade para assumir uma responsabilidade com tranquilidade e confiança, relembrando situações recentes em que recusei ou em que acabei por desistir de algo por alegada “falta de disponibilidade psicológica ou temporal”, enquanto me ia sussurrando ao ouvido com uma voz tremida e assustada “e se não conseguires…?normalmente atrofias sempre quando te pedem e, além disso, não tens escrito ultimamente…não vais conseguir.” ; no outro pólo lutava a minha sincera e concreta opinião (teórica mas não prática…) de que o erro tem de fazer parte de nós, pois quem não se dá à possibilidade de falhar não pode provar a vida verdadeiramente, quem não tenta acertar não poderá ser bem sucedido no seu caminho e ficará inevitavelmente cinzento…A abertura ao erro é a único estrada para o conhecimento, é através dele que aprendemos os misteriosos desígnios que nos confrontam a cada momento.

Do outro lado do meu estar pensante, onde me encontrava atento à ideia a trabalhar, acabei de ouvir o que o meu amigo me estava a comunicar num tom tranquilo mas motivante e tomei uma decisão. “Vou-me libertar destas malditas cordas de frio aço que me apertam o corpo e me sufocam a mente lentamente! Porque raio não devo eu aceitar?! Gosto do tema do texto, identifico-me com ele de uma forma quase ridícula e retiro um prazer gigante na escrita. Quero arriscar e vou fazê-lo!”, pensei para mim mesmo. “Na boa, vou tentar fazer isso.”, respondi-lhe instantaneamente. Isto pode ter sido um erro incrível e o cenário de desilusão pode cair como uma rocha em cima do meu fraco consciente mas, agora que o estou a acabar de escrever, posso afirmar com todo o orgulho que neste momento estou com um sorriso largo e parvo nos lábios e sinto-me incrivelmente bem. Posso ter errado? Ainda bem.


17/05/2006

Black 1 mescla de erros CMYK

K1_ME_CMYK

14/05/2006

Come to me world, come to papa. I'm gonna fuck you, and then i'm gonna make love to you!

Before drugs try yoga... Believe me!

02/05/2006

Ás vezes nem sabemos porquê mas continuamos a andar, parecemos máquinas!
dia após dia acordamos, vestimo-nos fazemos-nos ao mundo regressamos a casa deitamos-nos e fazemos tudo de novo...para quê?
sabem para quê?
Ás vezes não sei. tenho que parar um dia, ou dois e não fazer nada daquilo que me parece rotina...
aquilo a que não dou valor, porque me dá trabalho, chatices, dores de cabeça!Aquilo que me frustra, às vezes, e que nem sempre corre bem.
Mas quando páro lembro-me porque é que ainda não desisti, e porque é me sujeito dia após dia a tantos dissabores.
E vale a pena, mesmo que não corra bem...
vale a pena porque ....sim!