Erros (pre)vistos
Quando me propuseram escrever estas linhas o primeiro impulso que tive, mesmo antes de a ideia me agradar, foi o de pensar que teria de fazer algo para alguém e que, consequentemente, esse alguém esperaria então algo de mim. Ao ouvir da boca do meu amigo as cruas palavras “preciso que me escrev…” o meu corpo tornou-se instantaneamente tenso, quase em pânico; o estômago entrou numa convulsão estupidamente desorientada, senti o coração a bater com potência nas paredes do meu crânio e um súbito arrepio incrivelmente macabro percorreu-me rigorosamente desde a planta dos meus pés até ao cucuruto numa gradual propagação de sensações negativas transmitidas inconscientemente através do meu impiedoso hipotálamo para cada pedacinho do meu ser.
Apesar de não o aparentar exteriormente, no meu interior o estado de tranquila despreocupação que respirava na altura transformou-se num misto de ansiedade e alerta neurótico, de conclusões fatalistas precipitadas e de atenção receosa ao que me rodeava. Esta instintiva reacção, que durou um par de intensos segundos, serviu apenas de entrada à defensiva cisão que logo se criou no meu difuso estar pensante – de um lado encontrava-me eu a discutir comigo mesmo, duvidando da minha capacidade para agir e perspectivando cenários de falhanço e desilusão; do outro estava eu a encaixar a ideia que o meu amigo me queria transmitir, fazendo um esforço por me concentrar e interessando-me verdadeiramente pela cativante proposta que me apresentava.
Neste debate interior o meu consciente ia sendo encostado a um beco por dois pólos divergentes – o meu medo de agir (causado pela monstruosidade do erro), que ia questionando a minha real habilidade para escrever e a minha fraca capacidade para assumir uma responsabilidade com tranquilidade e confiança, relembrando situações recentes em que recusei ou em que acabei por desistir de algo por alegada “falta de disponibilidade psicológica ou temporal”, enquanto me ia sussurrando ao ouvido com uma voz tremida e assustada “e se não conseguires…?normalmente atrofias sempre quando te pedem e, além disso, não tens escrito ultimamente…não vais conseguir.” ; no outro pólo lutava a minha sincera e concreta opinião (teórica mas não prática…) de que o erro tem de fazer parte de nós, pois quem não se dá à possibilidade de falhar não pode provar a vida verdadeiramente, quem não tenta acertar não poderá ser bem sucedido no seu caminho e ficará inevitavelmente cinzento…A abertura ao erro é a único estrada para o conhecimento, é através dele que aprendemos os misteriosos desígnios que nos confrontam a cada momento.
Do outro lado do meu estar pensante, onde me encontrava atento à ideia a trabalhar, acabei de ouvir o que o meu amigo me estava a comunicar num tom tranquilo mas motivante e tomei uma decisão. “Vou-me libertar destas malditas cordas de frio aço que me apertam o corpo e me sufocam a mente lentamente! Porque raio não devo eu aceitar?! Gosto do tema do texto, identifico-me com ele de uma forma quase ridícula e retiro um prazer gigante na escrita. Quero arriscar e vou fazê-lo!”, pensei para mim mesmo. “Na boa, vou tentar fazer isso.”, respondi-lhe instantaneamente. Isto pode ter sido um erro incrível e o cenário de desilusão pode cair como uma rocha em cima do meu fraco consciente mas, agora que o estou a acabar de escrever, posso afirmar com todo o orgulho que neste momento estou com um sorriso largo e parvo nos lábios e sinto-me incrivelmente bem. Posso ter errado? Ainda bem.
1 Comments:
este texto foi o frança que me pediu para escrever para um trabalho dele sobre a temática do erro.
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